Você sabe quais são as doenças que mais acometem mulheres? Em meio à correria do dia a dia, é normal que deixemos de olhar sinais de alerta que o nosso corpo nos dá e outros fatores de saúde. Por isso, a Dra. Sara Pinheiros Reis, endocrinologista do Hospital São José, fez uma lista de tudo que você precisa saber sobre 4 doenças comuns em mulheres: endometriose, SOP (Síndrome do ovário policístico), HPV e mioma.
Miomas
Os miomas são tumores monoclonais benignos que acometem o útero. Ainda não se sabe ao certo sobre as suas principais causas, porém, estudos mostram que o surgimento deles é influenciado por fatores genéticos e hormonais. Os miomas uterinos são muito comuns e, em sua grande maioria, são assintomáticos e podem ser tratados de modo conservador.
Eles acometem com mais frequência mulheres em idade reprodutiva (após o início do ciclo menstrual) e costumam regredir após a menopausa, quando as taxas hormonais diminuem. Mulheres a partir dos 40 anos são mais propensas ao surgimento de miomatoses.
Mulheres obesas têm mais incidência de miomas pela maior concentração hormonal de estrogênio causada pela obesidade, e mulheres que praticam exercícios físicos regularmente são menos propensas a terem a doença. Mulheres com casos de miomatose uterina em parentes de primeiro grau têm 2,5 vezes mais chances de desenvolver o tumor. Mulheres negras têm 2,9 vezes mais chances de ter mioma.
Miomas não estão associados a altas taxas de mortalidade, porém podem afetar a qualidade de vida de algumas mulheres. Elas poderão apresentar dor pélvica e sangramentos anormais, com aumento do fluxo e da duração da menstruação, consequentemente, gerando mais estresse.
A ultrassonografia (USG) é o exame com melhor custo-benefício para diagnosticar os miomas, sendo capaz de precisar o tamanho e a localização do mioma, além de quantificar e identificar caso exista mais de um. A ressonância magnética (RNM) permite uma avaliação mais específica, porém com custo mais elevado.
De acordo com a localização nas camadas uterinas, podemos classificar alguns miomas mais comuns, como:
- Mioma submucoso: diminui a fertilidade, e sua retirada de forma cirúrgica possibilita que a mulher seja mais fértil.
- Mioma subseroso: não causa prejuízos à fertilidade.
- Mioma intramural: pode reduzir a fertilidade em alguns casos.
A classificação vai direcionar o tratamento e depende da localização exata do mioma no útero, de acordo com a camada uterina acometida por ele.
As indicações de tratamentos cirúrgicos vão variar de acordo com a idade da mulher, a possibilidade ou desejo de gestação e o tipo do mioma, considerando a sua localização.
As possibilidades cirúrgicas variam, podendo ser realizada apenas a retirada do mioma, em alguns casos, ou a retirada total do útero (histerectomia). Em mulheres com miomas assintomáticos, com sintomas leves ou moderados, a conduta mais abordada é o tratamento conservador. Isso também ocorre com mulheres próximas à menopausa, já que alguns miomas tendem a regredir com a queda das taxas hormonais.
Toda mulher com mioma deve fazer acompanhamento regular para avaliar o crescimento e surgimento de novos miomas, caso não seja realizado tratamento cirúrgico definitivo com a histerectomia.
Endometriose
O endométrio é uma camada uterina composta por várias células que são modificadas durante a menstruação. A endometriose é a presença de células do endométrio em locais fora da cavidade uterina. Os lugares mais comumente acometidos são o fundo de saco de Douglas, ovários e peritônio. Não se sabe ao certo a incidência e a prevalência da endometriose, pois o diagnóstico mais preciso é feito de formal visual, em campo cirúrgico.
A maior parte das mulheres acometidas pela endometriose apresenta como principal sintoma a dismenorreia intensa (cólicas menstruais), que se apresenta de forma cíclica com o período menstrual, podendo ser iniciada dias antes do primeiro dia da menstruação.
A dor tem diversas características, podendo ser mais aguda ou em forma de pressão, acometendo a região pélvica, o dorso, o reto ou a linha média do abdome. Algumas mulheres com endometriose podem apresentar ainda dispareunia (dor durante o ato sexual), infertilidade e sangramento uterino irregular, além de sintomas não ginecológicos, como distensão abdominal e urgência urinária.
O diagnóstico da doença não é totalmente definido por exames de imagem. É necessário complementar o quadro clínico, porém, o diagnóstico definitivo é feito apenas pela visualização direta em cirurgia, quando se observa o tecido endometrial em localização não habitual.
Investiga-se endometriose em mulheres que apresentam dismenorreia (cólicas menstruais), dispareunia (dor ao ato sexual), dor pélvica crônica e infertilidade, mesmo que esses sintomas possam estar presentes em outras doenças.
O tratamento inicial para os casos de endometriose é realizado com medicações para controle de dor e do fluxo menstrual. A primeira linha é utilizar anti-inflamatórios para que se diminua a dor e, também, anticoncepcionais para controle do ciclo menstrual. A inibição do ciclo menstrual minimiza os sintomas, já que não há ativação hormonal para o sangramento do endométrio tanto em localização habitual quanto na localização extrauterina da doença.
Em alguns casos, é necessária a cirurgia para remoção do endométrio encontrado fora da cavidade uterina, quando não se tem bons resultados com medicações por via oral. Após a visualização dos focos de endometriose no procedimento cirúrgico, é extraído material para biópsia para que haja a confirmação diagnóstica do caso.
Vale ressaltar que tanto o tratamento medicamentoso quanto o tratamento cirúrgico são avaliados e adequados a cada paciente individualmente após análise correta de todo o quadro clínico e exames complementares.
Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP)
A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é conhecida por ser um distúrbio hormonal muito comum entre as mulheres, que se dá pelo achado de cistos ovarianos, que se caracterizam por pequenas bolsas com conteúdo líquido ou semissólido nos ovários, atingindo até 10% das mulheres em idade fértil. A SOP pode causar diversos problemas à mulher, desde a presença de acne, obesidade e irregularidades menstruais até a infertilidade.
Algumas vezes, a doença pode ser confundida com o cisto ovariano. A SOP se difere pelo tamanho e quantidade de cistos, podendo aparecer na forma de múltiplos pequenos cistos, enquanto um cisto ovariano se apresenta normalmente em cisto único e de grande volume.
Normalmente, a mulher com SOP apresenta alterações menstruais, podendo ter poucos ciclos ao longo de um ano, fluxo intenso ou até a amenorreia (ausência do ciclo menstrual); hirsutismo, quando ocorre aumento na presença de pelos mais grossos e escurecidos no rosto, seios e abdome; obesidade, gerada pela síndrome e piorando o quadro; e acne, que ocorre pelo aumento da produção de gorduras por glândulas sebáceas. Outros sintomas decorrentes, como ansiedade, depressão e queda de cabelo, também podem ocorrer.
Para se obter o diagnóstico da SOP, é realizada, de preferência, a ultrassonografia transvaginal, para mulheres que já iniciaram a vida sexual, ou a ultrassonografia abdominal, para aquelas que ainda não tenham iniciado, em conjunto com exames laboratoriais de dosagens hormonais. Todos os achados dos exames complementares são avaliados em conjunto com os sinais e sintomas, para que se tenha um diagnóstico preciso e um melhor direcionamento para o tratamento. Se não tratada da forma adequada, a SOP pode causar obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares e infertilidade em longo prazo.
Como primeira linha de tratamento, é necessário avaliar se há sobrepeso na mulher. Caso haja, a prática de exercícios físicos e a redução do peso são partes fundamentais para início do tratamento. Além disso, por se tratar de uma doença crônica, o objetivo se torna sempre a melhora dos sintomas e da qualidade de vida da mulher.
Quando já se obtém um peso adequado e ainda assim a mulher é sintomática, o controle de hormônios deve ser acompanhado corretamente e, se necessário, iniciado uso de medicação anticoncepcional adequada para cada caso, para regulação da menstruação e controle hormonal. Com esse conjunto, é comum que já se consiga boa resolução dos sintomas e complicações futuras sejam evitadas.
HPV
O papilomavírus humano (HPV – sigla em inglês) é responsável por 50% dos tipos de câncer causados por vírus e é, também, a doença sexualmente transmissível mais prevalente no mundo. São catalogados cerca de 150 subtipos do HPV no mundo, em sua grande maioria, sem riscos graves à saúde. Porém, dois subtipos do HPV, os tipos 16 e 18, estão envolvidos em quase todos os casos de câncer de colo de útero, podendo também gerar o câncer de ânus, pênis, vulva, vagina e orofaringe.
O HPV é uma infecção sexualmente transmissível que pode ser contraída mesmo sem penetração no ato sexual, que se apresenta como verrugas irregulares, normalmente da cor da pele do indivíduo. Ela acontece pelo contato de mucosas com as verrugas grosseiras causadas pela doença. Essas verrugas podem ocorrer em toda a região genital masculina ou feminina, como pênis, vagina, vulva, ânus, bolsa escrotal e região inguinal, ou região oral/orofaringe. É comum também o contágio de bebês durante a passagem pela vulva no parto.
A doença é responsável pelo alto índice de câncer de colo de útero no mundo, com altas taxas de mortalidade. O câncer de colo de útero é grave e hoje representa o segundo tipo de câncer mais comum em mulheres de países desenvolvidos. Ele se inicia pela multiplicação de células anormais no colo do útero, causadas pela infecção pelo HPV, gerando lesões pré-cancerosas. A principal fonte diagnóstica dessas lesões pré-câncer é o exame Papanicolau (preventivo), que deve ser realizado regularmente pelas mulheres.
Pesquisas evidenciaram que no ano de 2018 cerca de 72 mil mulheres receberam diagnóstico de câncer de colo de útero e 34 mil morreram em decorrência da doença nas Américas. A nível mundial, é o tipo de câncer que gera óbito em cerca de 300 mil mulheres ao ano, o que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), são números assustadores, visto que há forma eficaz de prevenção da doença. No ano de 2020, a OMS classificou o câncer de colo de útero um problema de saúde pública mundial e estabeleceu como meta a erradicação da doença.
No Brasil, é estimado um número entre 9 e 10 milhões de pessoas contaminadas pelo HPV, com uma taxa de 700 mil novos casos ao ano. Alguns estudos demonstram que até 80% da população mundial sexualmente ativa deverá ser infectada por algum subtipo do HPV em algum momento da vida.
O câncer relacionado ao HPV pode levar até 20 anos de infecção persistente para que se manifeste sintomas, porém pode começar a surgir a partir dos 2 meses de evolução. A maioria dos casos acontece de forma assintomática, chegando a demonstrar sintomas quando a doença já está localmente avançada.
A prevenção do HPV é feita pelo uso de camisinha durante as relações sexuais e pela vacinação correta, realizada gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). É necessário ter cuidado com o contato com as lesões presentes em áreas que não estão protegidas pelo preservativo durante o ato sexual, visto que podem gerar contaminação.
É indispensável a realização do exame Papanicolau em mulheres que já iniciaram a vida sexual para o rastreio do HPV e, consequentemente, do câncer de colo de útero, sendo possível o diagnóstico precoce, elevando o índice de tratamento e cura da doença.
A vacinação contra o HPV foi iniciada em 2006, quando a vacina foi produzida na Austrália, e faz parte do sistema de imunização de mais de 50 países atualmente. No Brasil, sua produção é realizada pelo Instituto Butantan e abrange subtipos de HPV de baixo e alto risco, como os 6, 11, 16 e 18, evitando verrugas anogenitais, câncer de colo uterino, câncer de pênis, câncer de ânus e câncer de cavidade oral.
O Ministério da Saúde tem uma meta de vacinar pelo menos 80% da população elegível ao imunizante, porém, ainda enfrenta a barreira do desconhecimento da população a respeito da eficácia e segurança das vacinas. Atualmente, os índices de vacinação chegam apenas a 57% nas meninas brasileiras e 40% nos meninos, sendo o ideal para prevenção da doença uma cobertura de, ao menos, 90%.
A recomendação mundial é que a vacinação aconteça antes de se iniciar a vida sexual, para que a proteção já esteja presente no momento do contato com a doença, evitando seu desenvolvimento e transmissão.
A vacina do HPV é quadrivalente e está disponível em mais de 38 mil unidades básicas de saúde no Brasil, sendo recomendada a meninos de 9 a 14 anos, meninas e mulheres de 9 a 26 anos, pessoas imunossuprimidas (oncológicos ou pessoas vivendo com HIV), pessoas transplantadas dos 9 aos 45 anos e pessoas vítimas de violência sexual.
A vacinação é realizada da seguinte maneira:
- Entre 9 e 14 anos: 2 doses com intervalo de 6 meses.
- Entre 15 e 45 anos: 3 doses com intervalo de 2 meses entre a primeira e a segunda dose e intervalo de 6 meses entre a primeira e a terceira dose, para pacientes oncológicos, portadores de HIV, transplantados de órgãos sólidos ou medula óssea e pessoas vítimas de violência sexual.
É estimado pela OMS que até o ano de 2030 pelo menos 90% das meninas sejam vacinadas até os 15 anos; que 70% das mulheres tenham testes de qualidade acentuada aos 35 e aos 45 anos; e que 90% das mulheres com diagnóstico de câncer de colo de útero comecem o tratamento de forma adequada.